Revoltas

Revolta dos Dragões

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)Rio Grande de São Pedro

Início / fim

05 de janeiro de 1742 / 29 de março de 1742

Aquarela de Carlos Julião (1776) que retrata a elegância do oficial da cavalaria da guarda dos vice-reis contrastava com a situação dos Soldados Dragões que serviam no sul - "Riscos iluminados de figurinos brancos e negros", Acervo da Biblioteca Nacional

No dia 5 de janeiro de 1742, a infantaria, a artilharia e os soldados do Regimento dos Dragões iniciaram um motim contra as precárias condições de vida que enfrentavam no presídio Jesus-Maria-José, localizado em Rio Grande de São Pedro, na atual região do Rio Grande do Sul. Esses militares careciam de alimentos e se encontravam com o pagamento de seus soldos atrasados há mais de 20 meses. Sofriam também com uma rígida disciplina de trabalho marcada por agressões, proibições e castigos constantes. Eles reagiram, com o apoio da população local, ocupando a praça de guerra, elegendo oficiais e ameaçando passar para o domínio espanhol. Em 29 de março de 1742, o motim terminou quando os revoltosos tiveram grande parte de suas demandas atendidas por Gomes Freire de Andrade, Governador do Rio de Janeiro (1733 – 1763).

Na segunda metade do século XVII, a Coroa Portuguesa iniciou uma estratégia de expansão mais consistente em direção ao Rio da Prata com o principal objetivo de se apossar de metais preciosos oriundos dos domínios espanhóis. Em 1680, a Colônia de Sacramento foi fundada a fim de servir de entreposto entre o território platino e português. Esse assentamento gerou grande frustração para as autoridades hispânicas, que reagiram provocando conflitos frequentes e. A partir desses ataques, as autoridades lusas iniciaram um processo de ocupação do Brasil Meridional, na atual região do Rio Grande do Sul, no intuito de servir como um ponto de apoio à Colônia do Sacramento.

Em 1737 o presídio Jesus-Maria-José foi criado com a finalidade de solidificar este domínio no Rio Grande do Sul. Foi estabelecido um grupo militar, denominado Regimento dos Dragões, para guarnecer o presídio. As condições de vida, entretanto, foram extremamente difíceis para os primeiros habitantes desse local. As promessas da Coroa Portuguesa aos soldados e povoadores, de que teriam toda a infraestrutura e mantimentos necessários, mostraram-se ilusórias. A realidade era que “havia falta de tudo, de remédios, de igrejas, de tecidos, de cal, de pregos, de pedras, de ferro, de telhas, de madeira, de mulheres, de distrações, de moedas e de tijolos” (Alves, 2010, p. 35)

O cotidiano dos soldados era caracterizado por extrema precariedade. Em suas rações, careciam de mantimentos básicos e já não recebiam itens como carne ou farinha, base da alimentação militar. No final de 1741, contavam apenas com uma espiga de milho diária e uma abóbora fornecida a cada quinze dias, não podendo sequer obter outro meio de subsistência já que estavam proibidos de caçar ou de pescar. Ademais, havia muitas outras restrições impostas ao Corpo dos Dragões. Não podiam ter cavalos, estavam proibidos de transitar livremente, sofriam três inspeções diárias, que muitas vezes terminavam em “prisões e pancadas”. Diante de uma rotina marcada por impedimentos e castigos corporais, os soldados iniciaram um motim em 5 de janeiro de 1742. De acordo com os próprios militares, suas reivindicações não tinham o objetivo de “usurpar, nem perturbar a jurisdição real, nem fazer sublevações contra a fé pública e serviço de S. Majestade e suas ordens reais”. Na verdade, seus protestos eram contra o governador da capitania Diogo Osório Cardoso (1740 – 1752) e as dificuldades que eles enfrentavam sob sua administração.

As reivindicações dos revoltosos incluíam: direito de pesca, o fim das várias inspeções diárias, melhores tratamentos médicos, o fim das punições por suspeita de deserção, o encerramento das torturas e castigos e o afastamento do capitão Tomás Luís Osório. Os militares também contaram com o apoio ativo dos moradores. Afinal, a precariedade da estrutura e dos alimentos não era uma dificuldade somente dos soldados, mas de todos os habitantes. Dessa forma, eles não somente apoiaram como também participaram do movimento.

No primeiro dia do mês de fevereiro, o Brigadeiro José da Silva Paes saiu da capitania de Santa Catarina e se dirigiu até o presídio com o objetivo de pôr fim ao motim. Sua presença, no entanto, indignou ainda mais os soldados, já que ele havia chegado sem trazer os soldos e os mantimentos requeridos. Quando Paes tentou deixar o presídio na manhã seguinte, os militares não permitiram que saísse enquanto não prometesse remeter o dinheiro e roupas, e providenciasse que todas as queixas fossem devidamente atendidas. Paes aceitou as exigências e conseguiu deixar o local na tarde do dia 2 de fevereiro, permanecendo na Estância Real de Bojuru, até que um navio do Rio de Janeiro trouxesse o dinheiro e as provisões reivindicadas.

Foi somente no dia 29 de março que a embarcação entrou na barra trazendo os recursos exigidos. No entanto, o pagamento continha apenas um terço dos soldos atrasados. Os militares se enfureceram de tal modo que alguns ameaçaram passar para o lado do rei da Espanha. Sob a promessa de Silva Paes de que o restante do dinheiro chegaria em breve, as animosidades dos militares foram relativamente apaziguadas e eles terminaram aceitando a proposição.

As demais exigências, por sua vez, foram em sua maioria atendidas. Foi permitido que os soldados, dentro de alguns limites, obtivessem canoas e cavalos, os oficiais que cometeram excessos foram punidos e aqueles que sofreram maus tratos puderam sair daquele povoado. Além disso, em 15 de fevereiro de 1742, o Governador do Rio de Janeiro, Gomes Freire de Andrade (1733 – 1763), assinou um termo de notificação que perdoou os revoltosos.

A região em que ocorreu essa revolta estava subordinada à Capitania de Santa Catarina e esta, por sua vez, esteve sob jurisdição do governador do Rio de Janeiro desde 1738, segundo consta a carta régia de 11 de agosto do mesmo ano. Ela permaneceu sob jurisdição do Rio até sua independência em 1807.

(Daniel Freitas, graduando no curso de História da UFF e pesquisador do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ-CNE/2018-2021)

Antecedentes

Os soldados encarregados de guardar o forte Jesus, Maria, José passaram por muitas dificuldades como: fome, castigos corporais, direito de trânsito limitado e rígida disciplina.

Conjuntura e contexto

“A partir dos repetidos ataques à Colônia do Sacramento, passaram diversas autoridades lusas a elaborar planos e estudos no sentido de promover uma ocupação das terras mais meridionais do Brasil, no atual território do Rio Grande do Sul (…) Nesse sentido, após várias incursões a estas terras, a ocupação oficial portuguesa no Rio Grande do Sul se concretizaria em 1737 (…) Assim, a formação do Presídio Jesus-Maria-José significou mais um passo da expansão colonial portuguesa em direção ao sul.” (Possamai, 2010, p.34)

Grupos sociais

Autoridades

Ações de protesto não-violentas

  • Desobediência
  • Nomeação de autoridades
  • Ocupação de Ruas/Praças
  • Reunião com autoridades para negociar
  • Troca de cartas

Ações de protesto violentas

  • Prisão de autoridade

Repressão

Contenção

  • Negociações e acordos de paz
  • Perdão

Instâncias Administrativas

  • Governador da Capitania

Bibliografia Básica

ALVES, Francisco das Neves. “Uma Revolta Militar e Social no Alvorecer do Rio Grande do Sul”. In: POSSAMAI, Paulo César (org.). Gente de guerra e fronteira: estudos de história militar do Rio Grande do Sul. Pelotas: UFPel, 2010, p. 33-51.

QUEIROZ, Maria Luiza Bertulini. A vila do Rio Grande de São Pedro. 1737-1822. Rio Grande: FURG, 1987, p. 100-107.

RODRIGUES, Gefferson Ramos. Escravos, índios e soldados: povo, política e revoltas na América portuguesa do século XVIII (Pernambuco, Minas Gerais e Bahia). Tese (Doutorado em História) – Programa de pós-graduação em História, Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, 2015, p. 178.

POSSAMAI, P. Gente De Guerra E Fronteira: Estudos De História Militar Do Rio Grande Do Sul. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária UFPel, 2010.

Fontes impressas

AHRS. Anais da História do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 1977, p. 152-156.

Documentos Históricos da Biblioteca Nacional (DH) – Consultas do Conselho Ultramarino, Vol. XCIV, Rio de Janeiro, 1951, p. 92-97.

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