NL-Hana, OWIC, 1.05.01.01, inv 65, f. 91
A situação dos soldados dos terços de Salvador era motivo de preocupação das autoridades. A Fazenda Real não dispunha de dinheiro para pagar a ração ordinária e a Câmara Municipal havia atrasado o envio de gado para alimentar os soldados, o que fez com que os soldados ficassem vários dias sem receber ração. Após a morte do Bispo D. Pedro da Silva de Sampaio, algumas companhias dos terços de Salvador se amotinaram para reivindicar que seus soldos atrasados fossem pagos com o dinheiro que estava no cofre do Bispo. Luis da Silva Telles, almirante da Armada Real, conseguiu conter o motim sem o uso da violência, mobilizando o terço da Armada Real e negociando com oficiais dos terços de Salvador.
Com as faltas que padecem os soldados e com a ocasião da morte do Bispo deste Estado em cuja casa foi fama estivessem mais de cem mil cruzados se resolveram alguns soldados a se amotinarem (ou para) obrigar a lhes fazerem pagas ou como se tem por mais certo, para se eles pagarem (…)
(…) sendo onze horas da noite começaram a sair em tropas com armas a incorporar-se junto a Nossa Senhora do Desterro, do que fui avisado e dando conta ao General me ordenou fizesse o que me parecesse. Era isto a tempo que já seriam juntos mais de quatrocentos homens tocando uma corneta que era sinal para se incorporar a mais gente dos terços.
Mandei logo ao mestre de campo Dom Francisco Teles acudir ao seu terço e a mais gente que pudesse e formar-se em o terreiro de Jesus (…) tanto que os amotinados sentiram tocar as caixas do terço da Armada se começaram a recolher alguns deles. Marchou o mestre de campo Dom Francisco Teles trazendo o seu terço e a gente que governa o sargento-mor Gaspar de Souza Uchoa (…).
Haviam ficado até duzentos homens ainda pertinazes aos quais mandei o capitão Baltazar dos Reis que pelos aquietar lhes prometeu se retiraria a gente que eu tinha posto em aquela parte para que eles pudessem entrar sem serem conhecidos e assim se acabou de aquietar este rumor que tinha posto a tudo em grande cuidado.
Os soldados eram todos das companhias que governava o sargento-mor Ascenso da Silva ao qual e aos capitães mandou o General Antonio Teles [de Menezes] reformar e aos soldados repartir pelos mais terços, e ainda assim foi pequeno castigo para os descuidos dos oficiais e para a resolução dos soldados.
A intenção do almirante ao escrever a carta ao Rei foi a de demonstrar sua capacidade em organizar forças para negociar com os amotinados e conter o protesto. O autor enfatiza que foi por conta de suas ordens que metade dos amotinados se dispersaram e a outra metade aceitou negociar com as autoridades. Luis da Silva Telles também manifestou sua discordância quanto a punição que recaiu sobre os amotinados. Na sua avaliação, o castigo aplicado pelo governador-geral foi brando em relação às ações cometidas pelos rebeldes.
“amotinados”
“rumor”
“pequeno castigo”
“descuidos dos oficiais”
“resolução dos soldados”
“padecem os soldados”
“obrigar a lhes fazerem pagas”
Motim de soldados dos terços de Salvador (1649)
NL-Hana, OWIC, 1.05.01.01, inv 65, f. 91
MATOS, Gastão de Melo de. Notícias do Têrço da Armada Real (1618-1707). Imprensa da armada, Lisboa, 1932. 48-49.