Revoltas

Revolta de moradores contra os jesuítas

Capitania de São Vicente (1534 – 1709)Vila de Santos

Início / fim

13 de julho de 1640 / 03 de agosto de 1640

Data aproximada
"Matriz de Santos", óleo sobre tela de Benedicto Calixto, s.d. À esquerda da Igreja está o o conjunto arquitetônico dos Jesuítas, com o Colégio, palco do motim. Acervo Fundação Pinacoteca Benedicto Calixto.

No sábado, 13 de maio de 1640, a Vila de Santos foi agitada por uma revolta de moradores contra os padres da Companhia de Jesus. O tumulto teve início após o anúncio público do Breve Papal de 1639, que reforçava a proibição do cativeiro indígena sob pena de excomunhão àqueles que transgredissem as determinações de Roma. Os “homens-bons” que presenciaram o evento invadiram o Colégio dos Jesuítas (onde hoje se localiza a Praça da República) ao som de gritos e ofensas contra os padres. A situação apesar de controlada não evitou que, após decisão tomada em conselho, os jesuítas fossem expulsos de Santos em 3 de agosto de 1640.

O Breve Papal de 1639 buscava proteger as missões jesuíticas na América, alvo de frequentes ataques bandeirantes. A Capitania de São Vicente era justamente o centro dessa indústria bandeirante de caça e aprisionamento de índios. A aplicação do documento representava, portanto, um obstáculo para a continuação da atividade. 

A leitura do documento para os moradores se deu no dia 13 de maio de 1640 no Colégio dos Jesuítas. Imediatamente a “multidão” amotinou-se, gritando “fora com os padres da Companhia; mata, mata os padres da Companhia, que são a causa de tudo isso”. Quando o padre Jacinto de Carvalhais apareceu na janela, tendo em mãos a píxide (objeto utilizado para guardar as hóstias), a multidão ajoelhou-se em devoção, mas o apelo religioso não foi capaz de estancar a revolta, mesmo com a insistência do padre, que acusava os revoltosos de estarem contrariando o Papa e de terem atitudes piores do que hereges.

A multidão derrubou os portões e invadiu o edifício, exigindo aos jesuítas a cópia do Breve que havia sido lida. Não percebendo outra maneira de acalmar os ânimos, Jacinto de Carvalhais, ainda da janela, “tirou-o [o Breve] da manga do hábito e jogou-o sobre a multidão” (BOXER, 1973, p.148). A revolta cessou no mesmo dia, no entanto não se sabe ao certo como ela foi controlada. 

Diante desse episódio violento, a Câmara Municipal da Vila de Santos convocou dez procuradores, incluindo alguns de outras vilas como São Paulo, Rio de Janeiro e Mogi Mirim, que se reuniram em 24 de junho, Dia de São João Batista. Após dois dias de deliberação, os oficiais decidiram pela expulsão dos jesuítas da capitania de São Vicente, que deveria ser cumprida por todas as Câmaras da região até o último dia de junho de 1640. Os jesuítas, no entanto, não acataram as ordens e permaneceram em suas instalações. 

A expulsão efetiva só ocorreu em 3 de agosto. Nessa ocasião, os jesuítas de São Paulo de Piratininga já haviam sido botados fora da vila. Os moradores de São Paulo, observando a hesitação de Santos em fazer o mesmo, seguiram com os jesuítas até a vila de Santos para pressionar os colonos. Os padres de ambas as vilas saíram em barcos rumo ao Rio de Janeiro. Neles havia mais de cem homens armados, que disparavam tiros e tocavam tambores ao longo do caminho. Os jesuítas deixaram de vez a Capitania de São Vicente.

O retorno só aconteceu 13 anos depois, em 14 de maio de 1653, através de um acordo firmado na Vila de São Vicente, que permitia o retorno dos padres à capitania. Para que isso acontecesse, os padres deveriam desistir de todas as queixas contra os colonos envolvidos na rebelião, não poderiam apanhar índios fugidos que pertencessem a colonos para as missões e também não poderiam publicar o Breve Papal novamente. 

É importante ressaltar que a publicação do Breve Papal de 1639 também ocorreu em outras cidades do Brasil, como Rio de Janeiro e São Paulo, onde houve episódios parecidos com este. Além disso, mesmo a revolta tendo ocorrido na Vila de Santos, a administração do conflito estava subordinada ao Rio de Janeiro, uma vez que Salvador Correia de Sá, Governador da capitania, também era provedor da manutenção dos padres na sede das capitanias do Centro-Sul.

A região em que ocorreu esse motim, embora distante geograficamente do centro da capitania do Rio de Janeiro, estava sob sua jurisdição, e assim permaneceu até o ano de 1709, segundo consta a Carta Régia de 23 de novembro do mesmo ano.

 

(Giovanna Wermelinger, graduanda no curso de História da UFF e pesquisadora do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

Antecedentes

Jesuítas espanhóis chegam ao Brasil portando uma cópia do Breve Papal de 1639, que reforçava a liberdade dos índios na América.

Conjuntura e contexto

O contexto socioeconômico da Capitania de São Vicente na primeira metade do século XVII era de uma região secundária na economia colonial. A capitania exercia uma função muito mais administrativa e comercial do que propriamente a produção em larga escala. A esta altura, o tráfico negreiro já estava implementado e o uso da mão de obra africana escravizada já era considerável, mas destinava-se  majoritariamente às áreas de maior atividade econômica, ou seja, o Nordeste brasileiro. Em áreas periféricas, que eram pouco contempladas com o fluxo do tráfico transatlântico, mas cujos moradores visavam à prosperidade com o menor investimento, a escravidão dos nativos se torna a principal via de obtenção de mão de obra e o bandeirantismo para o aprisionamento e captura de índios acabou por se tornar uma das principais atividades da região.

Ao mesmo tempo, os missionários buscavam coibir a escravização dos indígenas e a Coroa publicava leis que também proibiam tal prática.

Grupos sociais

Autoridades

Ações de protesto não-violentas

  • Desobediência
  • Gritos
  • Ocupação de Ruas/Praças
  • Palavras de Ordem

Ações de protesto violentas

  • Cerco a imóveis
  • Expulsão dos jesuítas
  • Invasão de igrejas, conventos e templos católicos
  • Linchamento
  • Ofensas Públicas

Repressão

Contenção

  • Perdão
  • Sermões e pregações religiosas

Punição

  • Não informadas

Instâncias Administrativas

  • Câmara Municipal
  • Conselho Ultramarino
  • Rei

Bibliografia Básica

BOXER, Charles Ralph. Salvador de Sá e a luta pelo Brasil e Angola 1602-1686. São Paulo. Brasiliana, 1973.

LIMA, Sheila Conceição Silva. Rebeldia no Planalto: a expulsão dos padres jesuítas da Vila de São Paulo de Piratininga no contexto da restauração (1627-1655). Tese (doutorado) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Niterói, RJ. 2006.

Fontes impressas

LEME, Pedro Taques de Almeida Paes. Informação sobre as minas de S. Paulo [e] A expulsão dos jesuítas do Collegio de S. Paulo com um estudo sobre a obra de Pedro Taques por Affonso de E. Taunay. São Paulo: Melhoramentos. N/D

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Como Citar

Sem Nome, "Revolta de moradores contra os jesuítas". Impressões Rebeldes. Disponível em: https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/revolta/revolta-de-moradores-contra-os-jesuitas-2/. Publicado em: 13 de janeiro de 2025.