Revoltas

Revolta de Itapuã

Capitania da Bahia de Todos os Santos (1534 – 1821)Salvador

Início / fim

1 de janeiro de 1807 / 22 de maio de 1807

Data aproximada
Fragmento do mapa de Luís Teixeira, cerca de 1574 - Disponível em: http://www.bahia-turismo.com/salvador/itapua/itapua.htm

Na primeira metade do século XIX, a Bahia passou por uma série de levantes escravos. Dentre os fatores que contribuíram para a relativa frequência desses revoltas e conspirações, mais de trinta entre 1807 e 1835, podemos citar o aumento do número de escravos traficados da África para o Brasil, em grande parte, devido ao aumento da produção açucareira nos engenhos e o aumento da carga de trabalho sobre os escravos. A maioria dos africanos traficados para a Bahia, nesse século, veio da região da Nigéria e do Benin, oriundos de diversas etnias, entre elas, os chamados haussás.

Os haussás eram povos africanos consideravelmente islamizados que habitavam a região do interior do Golfo do Benim, no norte da atual Nigéria. Esses povos muçulmanos conviviam com a disputa religiosa e territorial, entre elas uma Jihad (guerra santa islâmica) declarada entre os haussás em 1804, e trouxeram este traço combativo para o Brasil. Na Bahia estiveram diretamente envolvidos no ciclo de revoltas escravas.

Salvador era uma das cidades com a maior concentração de negros e mulatos do período, o que levava a população dita branca a temer um levante de escravos. Essa tensão muitas vezes era aumentada por notícias como as da independência do Haiti em 1804, que os proprietários temiam que chegasse aos ouvidos de seus escravos e isso se tornasse uma inspiração.

Entre os anos de 1805 e 1809, a Bahia foi governada por João de Saldanha da Gama Melo Torres Guedes Brito, o Conde da Ponte. Em sua administração o Conde da Ponte tomou medidas violentas e altamente restritivas em relação aos escravos. A partir do ano de 1806 o administrador começou uma agressiva repressão aos calundus (manifestações religiosas de matriz africana praticadas por escravos) e pequenos quilombos localizados na periferia da cidade de Salvador, assim como investiu contra as curandeiras e contra os pequenos divertimentos dos africanos. Além disso, o Conde também impôs o toque de recolher às 21 horas para todos os escravos que não tivessem autorização escrita de seus donos para circular na rua a este horário.

Em 1807, em Salvador, os haussás organizaram um levante, programado para acontecer no dia de Corpus Christi. A revolta não ocorreu, porém, devido à delação de um escravo fiel ao seu senhor. É importante levarmos em consideração o fato da existência de redes de sociabilidade entre os escravos e também quilombolas presentes nas senzalas, tavernas, roças, plantações para que as revoltas e levantes pudessem ser articulados. Os haussás tinham por objetivo maior tomar o poder, matar os brancos e muitos aparentemente acreditavam poder retornar ao continente africano.

Demonstrando grande capacidade de coordenação, a revolta de 1807 previa levantes dos escravos em vários bairros da cidade e nos engenhos do Recôncavo, principalmente na região de Santo Amaro, onde os sediciosos tinham um “embaixador”. Além disso, os rebeldes teriam criado um fundo para adquirir material para a elaboração de armas. Quando o movimento foi desmontado, foram encontrados arcos, flechas e um tambor. É interessante esta referência, pois o tambor tem um significado ritual, mas também militar. [Os dois principais culpados foram condenados à morte e os outros açoitados. Nota I.R.] Os relatos demonstram a sofisticação do pensamento estratégico dos escravos, que arquitetavam aproveitar uma data religiosa que resultava em uma grande procissão, demandando assim a atenção da polícia e autoridades que estavam envolvidas. Foi a primeira de várias demonstrações dos cativos africanos na Bahia de suas pretensões de liberdade.

Os haussás se destacam neste momento histórico principalmente pela sua liderança e pelo seu inconformismo frente às relações impostas pela sociedade da época. Em sua maioria islâmicos, esses africanos resistiam ao catolicismo. Originados de uma região que vivia um Jihad, possuíam algum conhecimento militar e uma identidade coletiva amalgamada pelas características de sua religião. O objetivo do levante não era tomar e manter a cidade, mas atacar os brancos, adquirir navios e retornar à sua terra de origem. Nas palavras de João Reis: “[…] plano radical e mirabolante, talvez de fuga para a liberdade – abre o nosso mais importante ciclo de insurreições negras, o qual culminaria como levante malê de 1835.” Foi também noticiado que os rebeldes queriam fundar um reino independente no sertão e levar o movimento a Pernambuco.

Esse texto foi elaborado por Gabriela Harrison, Lucas Borges e revisado por João José Reis. A publicação original pode ser encontrada no site da Biblioteca virtual Consuelo Pondé, link: http://www.bvconsueloponde.ba.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=51

Grupos sociais

Autoridades

Lideranças

Ações de protesto não-violentas

  • Desobediência
  • Elaboração de arma
  • Reuniões em lugares privados

Repressão

Contenção

  • Prisões

Punição

  • Açoite e castigos público
  • Degredo / Desterro
  • Execução
  • Indenização dos prejuízos causados
  • Venda para fora da região

Instâncias Administrativas

  • Governador da Capitania

Bibliografia Básica

REIS, João José. “La revolte haoussa de Bahia em 1807: Résistance et controle des esclaves au Brésil”. Annales: Histoire, Sciences Sociales, vol. 61. (2006), p 383-418.

REIS, João José. Negociação e Conflito: a resistência negra no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

REIS, João José. “Quilombos e revoltas escravas no Brasil”. In: Revista USP, n. 28 (1995/1996). p. 14-39.

REIS, João José. Rebelião Escrava no Brasil: a historia do levante dos Malês em 1835. Ed. Revista e Ampliada, São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

RODRIGUES, Nina. Os Africanos no Brasil. 4 ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976.

REIS, João José & GOMES, Flávio dos Santos (org.). Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia das Letras, 1996, p. 373-406.

SILVEIRA, Renato. Sobre a fundação do terreiro do Alaketo. Afro-Ásia, v. 29-30 (2003). p. 345-380.

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