Revoltas

Motim militar a favor da Independência

Província do Grão-Pará (1821-1889)Belém

Início / fim

14 de abril de 1823 / 14 de abril de 1823

Largo das Mercês (atual Praça das Mercês), em Belém, Pará, retratado em fotografia de 1875, local onde os militares revoltosos no motim de 1823 se reuniram para marcharem até o Quartel de Artilharia de Belém. Coleção Derby. Cortesia do Museu de Ciências da Terra do Departamento Nacional de Produção Mineral.

Na madrugada entre os dias 13 e 14 de abril de 1823, militares, entre outros, liderados por Boaventura Ferreira da Silva tomaram importantes postos de Belém, numa tentativa de proclamar a independência do Grão-Pará e a adesão da província ao projeto imperial de Dom Pedro I. Apesar do sucesso inicial, a reação organizada das autoridades, lideradas pelo governador das armas, José Maria de Moura, além dos coronéis João Pereira Villaça e Francisco José Rodrigues Barata – que já tinham conhecimento de que uma rebelião do tipo aconteceria naquela noite – desencorajou Boaventura, que não desejava derramamento de sangue. Os rebeldes – dentre os quais, além de militares, alguns civis, como João Baptista Balbi – se renderam então no amanhecer do dia 14 e foram, em sua maioria, presos e deportados para Lisboa, enquanto alguns conseguiram fugir.

Após a declaração de independência por Dom Pedro I, em 1822, nem todas as províncias do território atualmente correspondente ao Brasil, aderiram de imediato ao seu projeto imperial. Entre as províncias de adesão tardia esteve o Grão-Pará, que só passaria a fazer parte do Império do Brasil em outubro de 1823; até lá, formou-se na província um contexto conturbado em que diversos grupos entraram em conflito, alguns destes buscando o rompimento definitivo dos laços com Portugal.

Na noite do dia 13 de abril de 1823, parte de um destes grupos reunia-se na casa de João Baptista Balbi, em Belém, esperando o momento de dar início a uma rebelião. Liderado por oficiais militares como Boaventura Ferreira da Silva, capitão do segundo regimento, além dos alferes Antonio de Loureiro Barreto e José Marianno de Oliveira Bello, o tenente-coronel José Narciso da Costa Rocha, entre outros, o grupo havia planejado tomar importantes postos militares da cidade e proclamar a independência da província para aderir ao projeto de Dom Pedro I, com o apoio de militares subalternos.

Os eventos transcorreram na madrugada, quando cerca de 100 homens sob o comando do alferes Antonio Barreto tomaram o parque de artilharia. A tomada não foi violenta; João Balbi, acompanhando os homens, fingira ser coronel, dando ordens para que as portas fossem abertas e surpreendendo os oficiais do parque, que não puderam reagir. Foi com fogos de artifício que Antonio Barreto então anunciou a ocupação do parque.

Os fogos sinalizaram o momento de continuar o plano: em outro local da cidade, em frente ao quartel do 2º regimento, agora ciente de que a primeira parte do esquema havia se realizado, o capitão Boaventura reuniu os militares do quartel. Juntaram-se ali mesmo ao esquadrão de cavalaria e seguiram ao Largo das Mercês, atual Praça das Mercês. Chegando ao Largo, os rebeldes encontraram mais aliados – o terceiro regimento, comandado pelo alferes José Narciso. Boaventura deu vivas a Dom Pedro I e à independência do Brasil; os revoltosos repetiram os vivas, e o grupo marchou para o quartel de artilharia, de onde planejavam se defender de possíveis reações.

Posicionados no local, os rebeldes protegeram os arredores do quartel de artilharia com canhões, que foram postos tanto à frente do edifício quanto nas entradas das ruas que levavam ao local – as do Açougue, de Santo Antonio, e dos Mártires. Foi então que ocorreu um episódio de violência da rebelião: o tenente-coronel José Antonio Nunes, fiel a Portugal, saiu do quartel e pôs fogo a um canhão, matando um militar e ferindo outro. Os rebeldes reagiram com vários tiros, cinco destes acertando Nunes. Gravemente ferido, o tenente-coronel morreria três dias depois.

         O amanhecer do dia 14 de abril de 1823 trouxe a primeira reação organizada das autoridades. Liderando o 1º regimento, o governador das armas, José Maria de Moura, os coronéis João Pereira Villaça e Francisco José Rodrigues Barata avançaram pela rua de Santo Antonio em direção ao quartel. Moura já tinha conhecimento prévio de que alguns dos revoltosos planejavam algum tipo de rebelião, mas não havia conseguido interceptar os planos das lideranças antes dos eventos da madrugada.

Enquanto as autoridades se aproximavam pela rua, um dos cadetes quis atirar com o canhão que a guardava, mas foi impedido por Boaventura, que dizia não querer derramamento de sangue. Percebendo a baixa moral dos rebeldes e a iminente desistência, o coronel Barata adentrou ao Largo das Mercês com seus aliados, dando vivas a Dom João VI, rei de Portugal, ato que sinalizava a rejeição à independência da província. Foi rapidamente correspondido e os revoltosos então se entregaram, pondo fim à rebelião.

A fortaleza da Barra, que ficava numa ilha de Belém e não existe mais após ter implodido em 1947, foi o local escolhido para alojar os militares sediciosos enquanto aguardavam julgamento. Alguns civis participaram do processo e foram levados à cadeia pública. Outros, entre eles tanto militares quanto civis, conseguiram escapar; parte destes, um mês depois, se envolveram na revolta do Muaná, que acontece na ilha do Marajó no mês seguinte, em maio de 1823. Outros fugitivos retornaram em 1824, após a independência; entre eles, o cadete Marcos Antonio Rodrigues Martins, que se tornou um importante ator político da região, fazendo parte do partido conservador e escrevendo para o jornal O Despertador.

Quanto aos indivíduos aprisionados, teriam sido condenados à morte, não fosse pela intervenção bastante efetiva de Romualdo Antonio de Seixas, presidente da junta governativa da província. Seixas temia que uma punição muito severa e a tantas pessoas, em tempos de alta instabilidade na região,  provocasse a eclosão de mais revoltas. Convencendo as outras autoridades, conseguiu que os 271 sediciosos fossem deportados para Lisboa, para lá ficarem presos. No entanto, de acordo com Domingos Antonio Raiol, muitos morreram na viagem. Além disso, com base nas afirmações de Clemente Mendes de Almeida, Mário Barata afirma que muitos padeceram de doenças na cadeia lisboeta de São Julião. Em decorrência disso, ao fim de suas penas, dos 271 deportados, apenas 171 retornaram ao Brasil. 

Leandro de Aragão Ferraz, Guilherme Godoy Marins e Yves Gabriel Rabacal Pacheco Urini, graduandos em História na UNIFESP. Texto é resultado da disciplina Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão I (2022/2).

Antecedentes

Em 1820, com a Revolução Liberal do Porto, os revolucionários do Porto, influenciados pelos ideais liberais, criaram as Cortes Lisboetas, e exigiam que o príncipe regente retornasse a Portugal, onde uma Assembleia Constituinte seria promulgada e, dessa forma, o absolutismo português teria fim. Porém, Dom Pedro I anuncia sua permanência em 1822.

Conjuntura e contexto

Em 1822, dada a permanência de Dom Pedro I e a declaração de Independência, o projeto imperial tem seu início.

Números da Revolta

1 dia de duração
271 participantes
271 condenados

Grupos sociais

Autoridades

Lideranças

Ações de protesto não-violentas

  • Aclamação de autoridades
  • Invasão de unidades militares
  • Marchas
  • Ocupação de Ruas/Praças
  • Palavras de Ordem

Ações de protesto violentas

  • Agressão de Autoridade
  • Mobilização de forças militares
  • Morte de inimigos
  • Tiros

Repressão

Contenção

  • Envio de autoridade
  • Expedição armada ou repressão militar

Punição

  • Envio de presos para Metrópole

Instâncias Administrativas

  • Junta Governativa Provincial

Bibliografia Básica

BARATA, Mário. Poder e Independência no Grão-Pará (1820-1823). Gênese, estrutura e fatos de um conflito político. Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1975.

BARATA, M. Independência e busca da unidade (1822-1823). Revista de História, v. 45, n. 92, 1972. São Paulo: USP, 1972. p. 323-336.

LUZ, Dayana Medeiros. O uso de jornais como recurso didático no ensino de história sobre as revoltas do período regencial. Dissertação (Mestrado Profissional em Ensino de História), Universidade Regional do Cariri, 2020.

MACHADO, André Roberto de Arruda. A quebra da mola real das sociedades: A crise política do antigo regime português na província do Grão-Pará(1821-25)”. Tese (Doutorado em História Social), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

MARIN, Rosa Elizabeth Acevedo. Alianças matrimoniais na alta sociedade Paraense no século XIX. Estudos Econômicos, v. 15, n. Especial. São Paulo: USP, 1985. p. 153-167.

RAIOL, Domingos Antonio. Motins Políticos ou História dos Principais Acontecimentos Políticos da Província do Pará desde o ano de 1821 até 1835. Belém: UFPA, 1970.

Arquivos e fontes manuscritas

Fonte Primária

Ofício (2ª Via) da Junta Provisória Revolucionária para o [ministro e secretário do estado dos Negócios do Reino] Filipe Ferreira de Araújo e Castro, sobre a sublevação da noite de 13 para 14 de Abril. - Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) – ACL – CU 013, CX. 160, D. RAIOL, Domingos Antonio. Motins Políticos ou História dos Principais Acontecimentos Políticos da Província do Pará desde o ano de 1821 até 1835. Belém: UFPA, 1970. 12155 (Projeto Resgate).

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