Revoltas

Motim de Soldados na Colônia do Sacramento

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)Colônia do Sacramento

Início / fim

1720 / 1720

Data aproximada
Canhão junto ao bastião de São Miguel e ao Rio da Prata na Colônia de Sacramento

Em meados de 1720, no forte da Colônia do Sacramento, no extremo sul da América portuguesa, um protesto foi iniciado pelos soldados rasos. O estopim foi o atraso de nove meses do pagamento do soldo, mas inúmeras dificuldades materiais e sociais já espalhavam descontentamento entre as tropas. Os amotinados exigiram seus pagamentos e ameaçavam oferecer seus serviços ao lado espanhol se fosse necessário. O desfecho, no entanto, foi a repressão do motim pelos oficiais superiores no mesmo dia, com os responsáveis presos e punidos com trabalho forçado e castigo físico.

Não era das tarefas mais fáceis ser soldado da guarnição estacionada na Colônia do Sacramento. Localizada no limite meridional da América portuguesa, Sacramento no inverno se metamorfoseava em inferno para os homens que a defendiam, pois tanto comida quanto fardas eram escassas, situação agravada pelo frio intenso, com ventos que sopravam gélidos e cortantes. Em 1720, o motim de soldados contra o comandante da unidade local por causa de um atraso de nove meses no pagamento do soldo chegou a um ponto tão grave que, por muito pouco, os soldados não debandaram para o lado vizinho. Ali estavam os espanhóis provocando tensões nas disputadas fronteiras. Os rebeldes ameaçavam abandonar o serviço no forte, o domínio português mais ao sul da América, deixando a conquista à mercê de piratas, índios, contrabandistas e espanhóis. A falta de soldados dispostos a prestar serviço na colônia do Sacramento jogava a favor dos amotinados, que assim tentavam criar uma vantagem na negociação de suas exigências. Isso também parecia tornar remota a chance de serem executados com a pena capital. Mesmo assim, diante do motim, os oficiais superiores intervieram rapidamente, conseguindo prender os líderes e debelaram o protesto, composto principalmente por soldados rasos.

Dando crédito aos documentos sobre a situação das tropas no Brasil colonial durante as primeiras décadas do século XVIII, percebemos que várias eram as motivações para que esses homens, diante das recorrentes dificuldades, fossem empurrados para decidirem pela deserção ou pela rebelião. A baixa oferta de alimentos, seus altos preços, as fardas inapropriadas para o clima inóspito, a falta de enfermarias, médicos e de privacidade, já seriam suficientes para esmorecer o espírito do mais corajoso dos soldados. A isso somavam-se um magro soldo, pago sem regularidade alguma (até meados de 1732) e que sofriam constantes descontos gerando endividamentos de soldados, além de atrasos na entrega das fardas, que levavam anos para serem distribuídas, a severidade de alguns oficiais e a indefinição quanto ao tempo de serviço que deveriam prestar.

Diante desse quadro na Colônia do Sacramento, muitos desertavam, sobretudo os militares solteiros, sem muitos laços enraizados na região. O destino era o outro lado da fronteira, passando a ser vassalo do rei espanhol ou, sorte rara, voltar para seu lugar de origem, desde que conseguissem lugar numa embarcação. É forçoso lembrar que boa parte da tropa da Colônia de Sacramento vinha do Rio de Janeiro, sendo a maioria “desclassificados” (vadios, criminosos, rebeldes e inválidos), pois eram a sobra dos que não fugiam do recrutamento ou não estavam isentos do serviço militar. O governo se beneficiava dessa situação, pois o alistamento também tinha a função de “limpar” a cidade de seus “elementos ruins”.

Ao chegarem na Colônia do Sacramento encontravam uma estranha situação pois mesmo a deserção sendo considerada um crime grave, era possível que os arrependidos pudessem voltar para seus postos caso quisessem. Como soldado era um artigo raro ali não convinha ser rigorosos demais com eles. Acabava-se por se criar uma lógica estranha e perversa: quanto mais desvalorizados mais esses homens desertavam e, na impossibilidade da reposição, acabavam tendo suas infrações toleradas. O governador da Colônia de Sacramento não podia prescindir desses homens para compor as suas tropas.

Quando o relato da rebelião chega ao soberano, apresentado pelo Conselho Ultramarino, D. João V adota o mesmo raciocínio com relação aos soldados que escolheram o caminho da rebelião. Em carta de fevereiro de 1723, quase três anos depois do motim, ordenou que o governador não tomasse nenhuma providência mais enérgica com os envolvidos no motim. Tudo continuava em seus lugares: soldados, atrasos, desvalorização.

A região em que ocorreu essa revolta, embora distante geograficamente do centro da Capitania do Rio de Janeiro, esteve sob jurisdição do governador desta capitania desde 1699 (Carta Régia de 9 de novembro), e assim permaneceu até 1705, quando foi invadida por espanhóis. Ela retornou para o domínio português em 1715, com a assinatura do Tratado de Utrecht, permanecendo sob sua jurisdição até 1735. A posse de Sacramento variou ao longo dos anos entre domínio português e espanhol devido aos conflitos territoriais, até a assinatura do Tratado de Santo Idelfonso em 1777, quando Sacramento passou definitivamente para o lado hispânico.

(Eduardo Chu, graduando no curso de História da UFF e pesquisador do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

(Fernando Pitanga, doutorando do PPGH da UFF e colaborador do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ-CNE/2018-2021)

Antecedentes

Os antecedentes para este episódio seriam as constantes péssimas condições de vida as quais os soldados de Sacramento eram submetidos

Conjuntura e contexto

Tensões entre as coroas ibéricas na região sul do Brasil. As duas nações disputavam territórios e tinham dificuldades em encontrar recursos humanos para ocupar e defender as novas posses, resultando numa constante mudança de posse de territórios.

Números da Revolta

Um dia de duração

Ações de protesto não-violentas

  • Deserção
  • Desobediência

Ações de protesto violentas

  • Não informadas

Repressão

Contenção

  • Prisões

Punição

  • Açoite e castigos público

Instâncias Administrativas

  • Conselho Ultramarino

Bibliografia Básica

CAMPOS, Maria Verônica. Governo de mineiros. “De como meter as minas numa moenda e beber-lhe o caldo dourado”, 1693 a 1737. Tese de Doutorado. São Paulo: USP, Departamento de História, 2002, p. 395.

POSSAMAI, Paulo César. A vida quotidiana na Colônia do Sacramento (1715-1735). Lisboa: Editora Livros do Brasil, 2006.

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