Revoltas

Motim contra os Jesuítas no Rio de Janeiro

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)São Sebastião do Rio de Janeiro

Início / fim

20 de maio de 1640 / 20 de maio de 1640

Palco do motim, o colégio dos jesuítas no Morro do Castelo é retratado no detalhe do mapa "Centro do Rio de Janeiro", de Luís dos Santos Vilhena (1775)

No dia 20 de maio de 1640, na cidade do Rio de Janeiro, jesuítas espanhóis divulgaram o Breve Papal de 1639, que reforçava a proibição do cativeiro indígena sob pena de excomunhão. Revoltados com a imposição, os “homens bons” da localidade (designação recebida pela elite formada pelos grandes senhores enobrecidos), que ouviram a proclamação do Breve, juntamente com soldados e moradores do recôncavo, invadiram o Colégio dos Jesuítas, no Morro do Castelo, ao som de gritos contra os padres. O tumulto foi controlado temporariamente pelo governador Salvador Correia de Sá e Benevides, mas a crise só foi resolvida de fato em 22 de junho do mesmo ano, com a assinatura de um acordo.

Os jesuítas espanhóis, em especial o padre Dias Taño, que trazia consigo cópias do Breve, aportaram no Rio em 15 de abril de 1640 e decidiram divulgar o documento imediatamente. Em reunião a 22 de abril no Colégio dos Jesuítas – juntamente com Salvador Correia de Sá – a pauta foi discutida e o desejo dos padres foi acatado (inclusive pelo prelado administrador do Rio, Pedro Homem Albernaz). No dia 4 de maio, no entanto, autoridades civis e religiosas da cidade demandaram um prazo maior para a divulgação, que foi desrespeitada pelos jesuítas. Em 20 de maio a proclamação foi feita, dando início aos tumultos.

O Breve buscava proteger as missões jesuíticas na América, alvo de frequentes ataques bandeirantes. Os bandeirantes paulistas, especializados no apresamento e escravização de nativos possuíam interesse no uso da mão-de-obra indígena, que estava diretamente ameaçado pelo Breve. A elite senhorial do Rio de Janeiro se beneficiava largamente dos índios capturados para o trabalho forçado nos engenhos e nos domicílios. Logo, o Breve também prejudicava os homens bons fora de São Paulo. Soma-se ao conflito de interesses o fato de o documento ter sido publicado em espanhol. No contexto da União Ibérica (1580-1640), para uma lei ser validada nas colônias portuguesas, sua publicação deveria ser feita em português e aprovada pelo Conselho de Portugal. Como nenhuma dessas exigências haviam sido cumpridas, os “homens bons” do Rio se posicionavam contra o Breve, defendendo sua ilegalidade.

A publicação foi feita pelo Padre Matias Gonçalves ao fim da terceira missa do dia, na qual estavam presentes membros do clero e moradores. Logo após a divulgação, uma multidão furiosa, composta inicialmente pelos “homens bons” que haviam presenciado ou souberam nas ruas sobre a leitura do Breve, foi em direção à casa do prelado Pedro Homem Albernaz, clamando por justiça. O prelado, em um primeiro momento, argumentou que não responderia pois era feriado, mas com a insistência da população, lançou a culpa sobre os jesuítas espanhóis. Os colonos dirigiram-se então ao Morro do Castelo rumo ao Colégio dos Jesuítas, onde se juntaram à cerca de 500 soldados, segundo relatam algumas fontes, encarregados de proteger o Colégio e um grupo de “gente mal afamada” vindo de Macacu, no recôncavo carioca. No local, eles arrombaram as portas a machadadas e invadiram o prédio aos gritos “mata, mata, bota fora, bota fora da terra, Padres da Companhia”. O controle do motim só foi estabelecido com a chegada de Salvador Correia de Sá, acompanhado de seus “guarda-costas”. A multidão concordou em desistir da ameaça de expulsão, mas só deixou o local quando o padre superior assumiu o compromisso de não divulgar mais o Breve.

A tentativa de conciliação se deu primeiro em reunião de 21 de maio do mesmo ano. Porém, com os ânimos ainda aflorados e a falta de confiança mútua, nenhum acordo foi feito. Já em 22 de junho, sob a mediação do Governador do Rio, as duas partes chegaram a um entendimento. Os jesuítas se comprometeram a atenuar os efeitos do Breve, não interferindo nos índios que estivessem prestando algum tipo de “serviço pessoal” aos colonos, seja nos engenhos, em domicílios ou no campo e devolvendo aos seus donos aqueles que estivessem refugiados nos aldeamentos. Os civis, por sua vez, desistiram de expulsar os padres da Companhia de Jesus do Rio.

O Breve papal não causou tumultos apenas no Rio, mas sua divulgação gerou conflitos nas vilas de Santos, São Vicente e São Paulo, onde a expulsão foi efetivada.

(Giovanna Wermelinger, graduanda no curso de História da UFF e pesquisadora do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

Antecedentes

Jesuítas espanhóis chegam no Brasil portando uma cópia do Breve papal de 1639, que decretava a liberdade indígena na América.

 

Conjuntura e contexto

Divulgação do Breve papal de 1639, que decretava a liberdade indígena na América.

 

Grupos sociais

Autoridades

Lideranças

Ações de protesto não-violentas

  • Palavras de Ordem
  • Reunião com autoridades para negociar

Ações de protesto violentas

  • Invasão de igrejas, conventos e templos católicos
  • Linchamento

Repressão

Contenção

  • Negociações e acordos de paz

Punição

  • Não informadas

Instâncias Administrativas

  • Governador da Capitania

Bibliografia Básica

ALVAREZ, José Mauricio Saldanha. “O Reino Noturno da Ronda da Guarnição: Agitação Militar no Rio de Janeiro do Século XVII”. CLAHR: Colonial Latin American Historical Review 15, no. 2 (2006): 143-75.

BOXER, Charles Ralph. Salvador de Sá e a luta pelo Brasil e Angola 1602-1686. São Paulo. Brasiliana, 1973. p. 143-147.

COARACY, Vivaldo. O Rio de Janeiro no Século 17. Rio de Janeiro: José Olympio, 1965, p. 98-101

LIMA, Sheila Conceição Silva. Rebeldia no Planalto: a expulsão dos padres jesuítas da Vila de São Paulo de Piratininga no contexto da restauração (1627-1655). Tese (doutorado) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Niterói, RJ. 2006. p. 108-109.

PINHEIRO, Joely Aparecida Ungaretti. Conflitos entre jesuítas e colonos na América Portuguesa: 1640-1700. Tese de doutorado. Campinas: UNICAMP, Instituto de Economia, 2007.

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