Revoltas

Inconfidência Carioca

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)Rio de Janeiro

Início / fim

08 de dezembro de 1794 / fevereiro de 1797

Em primeiro plano, o chafariz do Mestre Valentim, no Largo do Carmo (hoje Praça XV de Novembro), local de grande circulação de ideias dos pensadores iluministas no Rio de Janeiro. Leandro Joaquim – 1790. Acervo do Museu Histórico Nacional.

Na cidade do Rio de Janeiro, em 1794, é aberto um inquérito cujo principal objetivo era fazer apurações a respeito de um grupo de letrados que, aparentemente, alimentava planos de lutar contra o domínio da metrópole portuguesa. A devassa inquiriu os membros da Sociedade Literária do Rio de Janeiro e contou com dezenas de testemunhas, informantes e denunciantes. Ao final do processo, 11 suspeitos são acusados de Conjura e presos. A suposta discussão de ideias de cunho separatista no Rio de Janeiro estava diretamente ligada aos acontecimentos decorrentes das ideias ilustradas que corriam o mundo e também a fatores internos da possessão portuguesa na América.

Ao final do século XVIII, o mundo ocidental foi marcado pela influência das ideias da Ilustração. Ainda que o Iluminismo fosse um movimento de avanços e recuos, ele abalou o ocidente e, ainda mais, as áreas coloniais. A Independência das Treze Colônias inglesas, em 1776, a Revolução Francesa, em 1789, e a revolução de escravizados em São Domingos em 1791 influenciaram eventos em outros lugares, inclusive no Brasil. A primeira manifestação disso na colônia foi sentida em Minas Gerais com a Inconfidência Mineira, em 1789. Em 1794, um acontecimento mais tarde designado Inconfidência Carioca perturbou novamente a estabilidade e controle político da Metrópole. Esses movimentos demonstram que a circulação dos novos ideais europeus encontraram campo fertil no território, apesar da rigorosa censura, que perseguia os “abomináveis princípios franceses”. Nesse período, o Rio de Janeiro era o principal e mais importante entreposto do litoral da América portuguesa, o que exigia das autoridades portuguesas intensa fiscalização sobre a região. Mesmo assim, a circulação de livros de ideias penetrou o sistema de controle português e adentrou a sociedade carioca.

A Sociedade Literária do Rio de Janeiro (um prolongamento da Academia Científica fundada pelo Marquês de Lavradio em 1771) foi criada com aprovação do então vice-Rei Luís de Vasconcelos e Sousa em 1786. Formada por médicos, professores régios e gente letrada, seu objetivo primário era compartilhar conhecimento científico, mas posteriormente surgem  discussões que tocavam nas ideias advindas da Europa. Temerosos de uma Revolução em suas possessões ou que os eventos ocorridos anos antes em Minas Gerais (culminando com a execução de Tiradentes em 1792 no Rio de Janeiro) se repetissem, a Metrópole proibiu a presença de sociedade de letrados no país em 1793. Todavia, as reuniões da Sociedade Literária carioca continuaram a acontecer à noite, na casa do próprio Silva Alvarenga (localizada na Rua do Cano, atual Sete de Setembro), e ele que passou a ser considerado o principal fomentador da subversão na cidade do Rio de Janeiro.

No ano de 1794, era governador da capitania do Rio de Janeiro D. José Luís de Castro (1790-1801), o Conde de Resende, que também estava na condição de Vice-Rei do Brasil. Seu mandato, que teve início em 9 de julho de 1790, um ano após as primeiras prisões dos suspeitos por conspiração nas Minas Gerais e quando ainda corria nos tribunais da cidade o processo sobre tal crime, foi marcado por suspeitas e desconfianças constantes a respeito de conspirações, além da opressão às ciências naturais e à arte como forma de controle. Seguindo essa mesma conduta, o Conde de Resende solicitou, em 11 de junho de 1794, ao Desembargador Antônio Dinis da Cruz e Silva, Chanceler da Relação, a abertura de uma devassa contra os membros da sociedade literária. O processo tinha o objetivo de averiguar suspeitas de conjura contra o governo português. Por não acharem elementos suficientes para o inquérito, os conselhos do Chanceler da Relação frearam os planos do Vice-Rei, o que não o impediria de nova tentativa.

Diante desse fato, o Conde de Resende enviou duas figuras de sua confiança à procura de provas: José Bernardo da Silveira Frade, como infiltrado na Sociedade Literária, e Diogo Francisco Delgado, que buscava informações que corriam pela cidade. Após um período de investigação, no dia 8 de dezembro de 1794, um novo ofício para que se abrisse devassa é entregue pelo vice-rei.

Dessa vez, com as provas obtidas através dos informantes, o ofício foi aceito por Antônio Diniz da Cruz e Silva. Após a apuração da devassa, 11 membros da Sociedade Literária foram acusados de conspirar contra a dominação portuguesa, buscando o seu rompimento com a colônia. Eles foram imediatamente levados à Fortaleza da Conceição, onde permaneceram presos durante a investigação. A devassa se estendeu por três anos e contou com 65 testemunhas. No entanto, não se chegou a nenhuma prova concreta de que havia um plano prático de tomada do poder. Diante disso, a Coroa, em fevereiro de 1797, envia uma representação ao vice-Rei, na qual julga melhor soltar os presos, pois já teriam sido suficientemente castigados nos anos de prisão onde ficam até 1798.

O episódio ocorrido no Rio de Janeiro, em 1794, apesar de ter sido consagrado como “Inconfidência Carioca” ou até mesmo “Conjuração Carioca”, não corresponde aos títulos atribuídos. Alguns historiadores chegam a chamá-la de uma “fantasia”. Ademais, os membros Sociedade Literária não planejavam tomar o poder e separar-se de Portugal: eles restringiam-se à discussão de novas ideias vindas da Europa.

(Giovanna Wermelinger, graduanda no curso de História da UFF e pesquisadora do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

(Leandro Machado, graduando no curso de História da UFF e pesquisador do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

Antecedentes

O mundo ocidental passou a ser persuadido por ideias iluministas; ao final do século XVIII, eventos como a Independência das Treze Colônias, em 1776, e a Revolução Francesa, em 1789 trouxeram à tona o pensamento ilustrado e influenciaram episódios de contestação no Brasil. A Inconfidência Mineira em 1789 foi a primeira manifestação das ideias iluministas que chegavam no Brasil. Ao mesmo tempo que as autoridades coloniais estavam agitadas com os recentes acontecimentos, s professores régios, dentre eles Silva Alvarenga e João Marques Pinto prestaram queixa a Rainha, para impedir a interferência dos religiosos nos estudos da mocidade, o que motivou Silveira Frade a delatá-lo mais tarde.

Conjuntura e contexto

O final do século XVIII foi marcado pelo constante medo da influência das ideias francesas. Apesar do medo, novas ideias e pensamentos de teor iluminista pairavam sobre a sociedade carioca, o que despertou a atenção das autoridades portuguesas. O Rio de Janeiro, por ser o principal e mais importante entreposto do litoral da América portuguesa, exigia uma intensa fiscalização. Portugal passou a cumprir uma rigorosa política repressiva anti-revolucionária com o governo de Pina Manique. O que refletiu no comportamento do Vice-rei Conde de Resende. O vice-rei era um grande opositor das artes e das ciências, pois temia o impacto que estes poderiam aliciar a população para uma vertente revolucionária. Resende também obedecia rigorosamente a política de vigia de estrangeiros, principalmente de franceses, que eram presos no ato.

Números da Revolta

Aproximadamente 3 anos de duração
76 participantes

Outras designações

Conjuração Carioca

Inconfidência do Rio de Janeiro

Conjuração do Rio de Janeiro

Tipologia

Reivindicações

Soberania

A revolta foi interrompida pelas seguintes razões

Grupos sociais

Autoridades

Delatores

Réus e Condenados

Ações de protesto não-violentas

  • Reuniões em lugares privados

Ações de protesto violentas

  • Não informadas

Repressão

Contenção

  • Prisões

Punição

  • Não informadas

Instâncias Administrativas

  • Governador da Capitania

Bibliografia Básica

MARCELO, Cristiane Maria. Manoel Inácio da Silva e as luzes portuguesas. Usos do passado: XVII encontro regional de história – Anpuh. Rio de Janeiro, 2006.

NEVES, Guilherme Pereira das. O Rio de Janeiro de 1794 no Tribunal das Luzes de Reinhart Koselleck. História, teoria e variações. Rio de Janeiro: Contra Capa, Companhia das Índias, 2011. p. 255-279

SANTOS, Afonso Carlos Marques dos. No rascunho da nação: inconfidência no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. Biblioteca carioca, 1992.

TUNA, Gustavo. “Conjuração do Rio de Janeiro (1794)”. In: SCHWARCZ, Lilia M., STARLING, Heloisa M. (org). Dicionário da República: 51 textos críticos. 1ª ed. São Paulo. Companhia das Letras, 2019. p. 60-66.

VAINFAS, R. Dicionário do Brasil colonial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. p. 139-140.

Fontes impressas

Autos da devassa: prisão dos letrados do Rio de Janeiro, 1794. Brasil, UERJ, 1994.

Devassa ordenada pelo vice-rei Conde de Resende – 1794. Anais da Biblioteca Nacional, vol LXI, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1941, p. 239-323

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