Revoltas

Conspiração contra autoridade eclesiástica

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)Rio de Janeiro

Início / fim

07 de fevereiro de 1629 / 08 de fevereiro de 1629

"Escola dos Jesuítas", obra de Cândido Portinari (1938) projetada para o auditório do Palácio Gustavo Capanema no Rio de Janeiro

Na manhã do dia 8 de fevereiro de 1629, o prelado Mateus da Costa Aborim foi encontrado morto em sua casa, na antiga Rua da Misericórdia, no Morro do Castelo, próximo ao local onde hoje se localiza o Palácio da Justiça, no centro do Rio de Janeiro. Tudo indicava que a causa da morte havia sido envenenamento. O administrador eclesiástico era muito ligado aos jesuítas e sempre buscou defender seus interesses, principalmente no tocante à liberdade dos índios. Tal fato causava recorrente descontentamento da população com o prelado. Aborim também possuía desavenças com o padre Manuel da Nóbrega (não confundir com seu homônimo, o ilustre jesuíta, que já havia falecido em 1570), que também passou a ser suspeito do crime, assim como colonos importantes ligados ao tráfico indígena. Nesse período, a vida econômica da região era movida pelo trabalho das populações nativas escravizadas, que se ocupavam de atividades nas fazendas de açúcar e de mantimentos, e no incipiente centro urbano e portuário à beira da baía de Guanabara.

Mateus da Costa Aborim, natural da vila de Ponte de Lima, em Portugal, assumiu o cargo de administrador eclesiástico do Rio de Janeiro em 2 de outubro de 1607. Seu período de administração foi extremamente conturbado, principalmente por conta dos seus conflitos com os moradores e oficiais, como camaristas e magistrados locais. O padre era muito próximo dos jesuítas e agia de modo a defender abertamente os interesses da Companhia de Jesus. A questão central dos conflitos era acerca da liberdade indígena, defendida pela Igreja Católica e, portanto, pelo prelado. Os colonos possuíam interesse tanto na mão de obra indígena quanto no seu tráfico, duas atividades que eram extensamente realizadas na época. Os moradores não aceitavam a intervenção de Aborim nesses assuntos que, de acordo com eles, deveriam ser de competência do soberano. O prelado chegou a usar de artifícios ao seu alcance para tentar garantir a liberdade dos índios, como a ameaça de excomunhão a qualquer um que negociasse com os índios carijós que estivessem nas reduções jesuítas. A população constantemente recriminava as ações do administrador eclesiástico.

Outra zona de conflitos era com as autoridades civis do Rio de Janeiro. Mateus da Costa Aborim também era frequentemente acusado de interferir em questões que não lhe cabiam, suscitando o descontentamento de oficiais da Câmara e outras figuras da administração local. Um exemplo marcante de suas atitudes consideradas arbitrárias aconteceu em 1613, quando o Desembargador Manuel Jácome Bravo veio da Bahia investigar as ações do Governador do Rio de Janeiro Afonso de Albuquerque (1608-1613). O Desembargador havia ordenado uma devassa contra o Governador, apoiado pelo prelado. Aborim, diante disso, lançou excomunhão ao Desembargador Bravo, o que, de acordo com a legislação da época, o incapacitava de realizar qualquer função pública.

A Câmara Municipal protestou contra o ocorrido e o administrador eclesiástico disse, segundo o cronista Vivaldo Coaracy, que “ele não respondia à Câmara por estar ocupado e que tudo quanto obrara era bem feito e que no Colégio havia padres a quem podiam perguntar se a excomunhão estava bem imposta ou não” (COARACY, 1965, p.37).

Mateus da Costa Aborim também possuía desavenças importantes com o padre Manuel da Nóbrega. Nóbrega, em 1625, se apresentou no Rio de Janeiro portando uma carta régia que o nomeava para vigário geral de São Sebastião, que era até então a única freguesia da cidade, cujo cargo já estava preenchido pelo padre João Pimentel. Por esse motivo, o prelado não concedeu o posto ao padre Nóbrega, que logo iniciou uma campanha contra Aborim. É importante ressaltar que Manuel da Nóbrega era descendente de judeus, logo, um “cristão-novo”. A população colonial, em geral, nutria relativo preconceito religioso contra cristãos-novos e a ideia de ter um como vigário geral lhe causava repulsa. Ao rejeitar a nomeação, Aborim deixava de acatar uma ordem régia, sendo, neste caso, excepcionalmente apoiado pelos moradores em sua decisão.

O administrador eclesiástico foi encontrado morto em sua casa na manhã do dia 8 de fevereiro de 1629, com sintomas de ter ingerido veneno. Não houve muita investigação sobre o caso, nem o culpado foi descoberto. Algumas pessoas especulavam que o envenenamento foi obra de “pessoas poderosas” ligadas ao tráfico de indígenas escravizados. A voz pública, no entanto, elegeu o padre Nóbrega como principal culpado, fato impulsionado pelo preconceito que se nutria contra descendentes de judeus. Mateus da Costa Aborim foi sepultado na Igreja Matriz , no antigo Morro do Castelo e as circunstâncias de sua morte permanecem um mistério até hoje.

(Giovanna Wermelinger, graduanda no curso de História da UFF e pesquisadora do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

Antecedentes

Conflitos entre Mateus da Costa Aborim com os colonos do Rio de Janeiro e com o Padre Manuel da Nóbrega.

 

Conjuntura e contexto

Disputa entre colonos e jesuítas pela administração dos índios

 

Números da Revolta

1 dia de duração

Outras designações

Envenenamento do prelado

Grupos sociais

Autoridades

Lideranças

Ações de protesto não-violentas

  • Não informadas

Ações de protesto violentas

  • Envenenamento

Repressão

Contenção

  • Não informadas

Punição

  • Não informadas

Instâncias Administrativas

  • Câmara Municipais

Bibliografia Básica

COARACY, Vivaldo. O Rio de Janeiro no Século 17. Rio de Janeiro: José Olympio, 1965, p. 72-73

FAZENDA, José Vieira. Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, v.1. 1921. p. 53-57.

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