Revoltas

Ataque Franco-Tamoio aos portugueses

Capitania Real do Rio de Janeiro (1567 – 1821)Rio de Janeiro | Baía de Guanabara

Início / fim

10 de março de 1565 / 13 de março de 1565

Em 1565, no litoral do Rio de Janeiro, acontecia uma sangrenta guerra entre os tamoios, aliados aos franceses, e os temiminós, aliados aos portugueses. O principal comandante português, Estácio de Sá, havia conseguido vitórias importantes e, no dia 1° de março, fundou o Rio de Janeiro, que não passava de uma fortaleza em construção entre o sopé do morro Cara de Cão e o Pão de Açúcar. Os franco-tamoios, insatisfeitos com o assentamento lusitano, armaram uma armadilha para liquidar seus inimigos. No dia 10 do mesmo mês, uma nau francesa se posicionou no campo de visão da fortaleza atraindo parte das tropas portuguesas para o mar, enquanto 48 canoas atacariam o restante do forte. Apesar do planejamento, o ataque falhou e muitos indígenas morreram baleados pelos lusitanos murados no forte. No dia 12 os franceses foram convencidos a se renderem e a entregarem seus armamentos e pólvora em troca de suas vidas. Traídos por seus aliados e desconfiados da piedade portuguesa, os tamoios recuaram e atacaram no mesmo dia com 27 canoas, mas não foram suficientes, sofrendo outra derrota, desta vez também atacados por seus antigos parceiros europeus.

A fundação de um assentamento como São Sebastião do Rio de Janeiro no meio de uma guerra entre os tamoios aliados aos franceses e os temiminós aliados aos portugueses foi um marco da conquista portuguesa, uma mensagem prévia dos futuros planos dos europeus, que invadiam as terras dos nativos e a irrigavam com o suor e o sangue desse povo escravizado. 

A origem do conflito se dava na tentativa francesa de ocupar o atual sudeste brasileiro, território reclamado pelos lusitanos. Os parceiros nativos também tinham seus motivos, os tamoios já haviam sido escravizados pelos portugueses e ainda eram inimigos dos temiminós. Os tamoios, como povo guerreiro que eram, não poderiam envergonhar seus ancestrais e permitir que os perós (“gente desalmada” em tupi, maneira como muitas tribos se referiam aos portugueses) os dominassem. 

Dessa forma, São Sebastião do Rio de Janeiro também era uma resposta à criação da França Antártica na região desde 1555, um sinal de que a presença de outros estrangeiros não seria mais tolerada. Os lusitanos não desejavam que seus rivais consolidassem uma colônia em seu território no Novo Mundo.  

Segundo Aylton Quintiliano, o cacique Aimberê teria enviado seu genro Ernesto para negociar um acordo com os franceses. Em troca da ajuda para expulsar os portugueses do forte, eles cederiam uma grande quantidade de pau-brasil, sândalo e outras madeiras de valor. O trato foi aceito e foi arquitetado um plano de ataque. Três navios franceses, próximo ao forte serviriam como distração, atraindo parte das forças inimigas e enfraquecendo a guarnição restante. Em seguida, 48 canoas cheias de guerreiros atracariam na praia e as forças tupinambás invadiriam o forte pelo lado onde o muro ainda não estava completo. 

O plano estava marcado para ocorrer no dia 10 de março. Naquela semana, os 300 soldados portugueses trabalhavam na construção de São Sebastião. Os muros, o poço e uma igreja foram as prioridades, mas os lusitanos não foram capazes de terminar tudo antes do ataque. 

A visão das naus francesas foi o suficiente para atrair Estácio de Sá e parte da guarnição para fora do forte, que se lançaram ao mar para batalhar. Os portugueses foram recebidos a tiros, iniciando a peleja naval, enquanto, do outro lado, as 48 canoas surpreenderam os soldados lusitanos pelo seu lado mais frágil. 

A execução da cilada não atingiu as expectativas de seus criadores. Os muros, apesar de incompletos, protegeram os perós das flechas tamoias e permitiram que suas armas de fogo alvejassem com relativa facilidade os guerreiros na praia. Desse modo, o ataque não conseguiu penetrar no forte e diante de tantas baixas os nativos recuaram. Estácio de Sá, assim que percebeu a cilada, recuou da batalha em que se encontrava em direção ao forte, mas quando chegou os defensores já haviam repelido os tupinambás. Quintiliano afirma que as naus francesas não pareciam estar engajadas no plano, pois não deram um combate efetivo aos lusitanos, recuando na primeira oportunidade que tiveram, praticamente se rendendo e se mantendo ancoradas no interior da Baía de Guanabara. 

O historiador Balthasar Silva Lisboa relata que três dias sem conflito se seguiram, até que no dia 12 de março, Estácio de Sá decidiu conversar com os franceses ancorados na Baía de Guanabara. Ele ia acompanhado de Martim Paris, um soldado que chegara ao Brasil nas expedições francesas e havia abandonado seus compatriotas para se unir aos portugueses. O objetivo do comandante português era tê-lo como mediador da conversa. O líder lusitano prometeu aos franceses que, caso se rendessem, poderiam ir embora ilesos, desde que entregassem seus armamentos e pólvoras. A barganha foi aceita, mas os tamoios presentes no barco não acreditaram em Estácio de Sá, preferindo pular ao mar e recuar do que se render.

No mesmo dia, um novo ataque ocorreu, 27 canoas tamoias se digladiaram contra dez canoas e barcos lusitanos (incluindo os outros europeus que haviam “virado a casaca”) e mais uma vez o ataque falhou. O navio francês partiu para seu país de origem e os indígenas foram obrigados a recuar e assistir o novo assentamento português se consolidar ao longo dos anos, enquanto as invasões estrangeiras penetravam cada vez mais fundo em suas terras. 

Este segundo ataque ratifica que os tamoios tinham sua própria agenda e autonomia de planejamento, sua resistência aos portugueses não era uma extensão das rivalidades europeias, estava longe de ser apenas um recurso para alguma nação do velho continente, eram protagonistas de sua própria história. 

Esse episódio demonstra a resistência indígena frente às invasões portuguesas, estando profundamente relacionada com a fundação da cidade do Rio de Janeiro, uma vez que o ataque visava justamente impedir sua consolidação. Os tamoios não eram passivos aos portugueses ou mesmo fantoches manipulados pelos franceses, mas um povo independente que era capaz de tomar decisões próprias e ter sua própria agência.

 

(Eduardo Chu, graduando no curso de História da UFF e pesquisador do projeto “Um Rio de Revoltas” – FAPERJ -CNE/2018-2021)

Antecedentes

O que precede esse evento é a decisão dos portugueses de ocuparem o litoral da Guanabara para expulsar os franceses e garantir sua soberania no território. Os franceses se aliariam com os tamoios e os Portugueses com os temiminós.

 

Conjuntura e contexto

Esses episódios estão dentro do contexto das guerras da confederação dos tamoios. Ocorridos no atual sudeste brasileiro durante a década de 1560, os portugueses se mobilizaram para expulsar os franceses da região.

 

Números da Revolta

3 dias de duração
1 a 3 naus francesas, cerca de 48 canoas indígenas, 300 soldados portugueses participantes

Grupos sociais

Lideranças

Ações de protesto violentas

  • Ameaça de destruição da cidade
  • Batalhas e combates
  • Flechas Disparadas

Repressão

Punição

  • Escravização e reescravização

Instâncias Administrativas

  • Governador da Capitania

Bibliografia Básica

DORIA, Pedro. 1565 – Enquanto o Brasil nascia: a aventura de portugueses, franceses, índios e negros na fundação do país. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012, p. 121-122.

QUINTILIANO, Aylton. A Guerra dos Tamoios. 1ª. ed. Rio de Janeiro: Reper Editora, 1965, p. 213-217.

SILVA, Rafael Freitas. O Rio antes do Rio. Rio de Janeiro: Babilônia Cultural Editora, 2015, p. 403-404.

Fontes impressas

LISBOA, Balthazar da Silva. Annaes do Rio de Janeiro: contendo a descoberta e conquista deste paiz, a fundação da cidade com a historia civil e ecclesiastica, até a chegada d’El Rey D. João VI; além de noticias topographicas, zoologicas, e botanicas. Tomo I. Rio de Janeiro: Na Typ. Imp. e Const. de Seignot-Plancher e Ca. 1834, p. 91-94.

    Imprimir página

Compartilhe