LENK, Wolfgang. Guerra e Pacto Colonial. A Bahia contra o Brasil Holandês (1624-1654). São Paulo, Alameda, 2013.
09 de maio de 1624 / 30 de abril de 1625
Em 9 de maio de 1624, rompeu na barra de Salvador uma poderosa esquadra holandesa, contendo mais de duas dezenas de embarcações, onde 3.300 homens se preparavam para descer em terra e tomar a capital colonial. Alguns sinais do ataque iminente já vinham sendo emitidos para as autoridades portuguesas, em especial para o governador geral do Brasil, Diogo de Mendonça Furtado, com notícias de barcos holandeses rondando o litoral baiano. Ademais, desde dezembro anterior o governador já havia sido prevenido de que uma grande armada da WIC (Companhia das Índias Ocidentais) partira da Europa em direção à América, tendo como objetivo provável o saque de alguma importante cidade portuária do Império colonial dos soberanos Habsburgo que governavam a Espanha ( não nos esqueçamos que a União Ibérica, que perdura até 1640, ainda estava em vigor). Preparativos foram feitos para a defesa de Salvador e mobilizadas as ordenanças, todos os homens entre 18 e 60 anos de idade, para conter o ataque iminente. Contudo, as semanas se passaram e nenhum sinal de rebate foi dado. E os soldados voltaram para cuidar das lavouras, principalmente no Recôncavo, área produtora do valioso açúcar.
A desmobilização explica a facilidade com que os batavos desembarcaram e se apropriaram da cidade em maio de 1624. O governador ainda ensaiou uma fraca resistência com alguns comandados mas foi inútil. Preso, foi remetido para a Europa com parte das mercadorias saqueadas pelos holandeses. Mas o que parecia uma operação de pilhagem típica da pirataria ou uma razzia tão comum nos conflitos entre os Estados Modernos, transformou-se numa ocupação permanente.
Nas semanas seguintes houve tentativas de tomada de áreas fora da capital, com o intuito de garantir o abastecimento das forças invasoras, por um lado e, por outro, ter acesso ao grosso do açúcar que se encontrava nos engenhos do Recôncavo. Mas daí por diante as coisas não seriam tão fáceis para os holandeses. À exceção de alguns escravos capturados, como aqueles que estavam na cidade e outros que fugiram de seus amos luso-brasileiros, os invasores não tiveram nenhum auxílio externo. Com o passar dos meses, as provisões foram escasseando, aumentando muito a insatisfação da tropa. Uma esquadra prometida pela WIC não apontava no horizonte e as expedições formadas para se conseguir algum tipo de alimento nos arredores de Salvador não surtiam o efeito desejado pois eram fustigadas por índios, negros e os moradores que conseguiram se organizar numa espécie de guerrilha, com um considerável poder desestabilizador. Numa dessas sortidas holandesas, o comandante do seu exército Jan Van Dorth foi abatido de modo cruel pelos seus opositores, tendo decepada sua cabeça e enviada para Salvador como forma de aviso para os que continuassem na cidade.
A revolta contra os invasores foi tomando corpo, a partir das resistências locais. Após quase um ano de ocupação, a situação dos invasores era dramática. A falta de alimentos fomentava doenças e muitas insatisfações. O comando das tropas julgava-se esquecido pela Companhia das Índias que não enviava mantimentos e tropas frescas. O golpe de misericórdia nas aspirações batavas chegou na quinta-feira santa de 1625, dia 27 de março, com a aproximação rumo ao porto de Salvador de uma poderosa força naval de 56 vasos de guerra, mais de um milhar de peças de artilharia e cerca de 12 mil soldados, entre forças portuguesas, castelhanas e napolitanas. Essa força ficou eternizada como Jornada dos Vassalos, por conta da quantidade considerável de nobres que embarcaram, todos sob o comendo do militar espanhol D. Fadrique de Toledo Y Osório. Mas engana-se quem acha que os batavos se renderam à primeira visão de uma esquadra tão numerosa e bem municiada. Os poucos mais de dois mil holandeses empreenderam uma encarniçada resistência aos restauradores, só começando a fraquejar depois de quase um mês de intenso bombardeio da cidade e uma onda de deserções nas suas tropas, sobretudo de mercenários tedescos, franceses e ingleses. E ainda houve tempo para um amotinamento da tropa restante, insatisfeita e certamente já desejosa de uma rendição. Em 30 de abril de 1625, a capitulação foi assinada pelos comandantes das forças envolvidas. Aos holandeses foi garantida uma retirada sem serem molestados, embarcando para a Europa. Aos escravos e homens livres que colaboraram com o invasor não houve essa complacência: todos pereceram na forca.
A capital estava livre do domínio batavo mas não se conseguiu evitar que fosse saqueada pelas forças castelhanas e napolitanas que vieram de suas terras justamente para libertar Salvador do jugo holandês. Para soldados que costumeiramente não recebiam seus soldos em dia, a perspectiva do saque era o grande atrativo para se atravessar um oceano. Não surpreende que alguns contemporâneos tenham se assustado mais com as forças “libertadoras” do que com as invasoras. Do perigo da ocupação holandesa a América portuguesa estava livre. Mas por muito pouco tempo.
11 meses e 21 dias de duração
Recuperação da Bahia
LENK, Wolfgang. Guerra e Pacto Colonial. A Bahia contra o Brasil Holandês (1624-1654). São Paulo, Alameda, 2013.
Sem Nome, "Restauração da Bahia". Impressões Rebeldes. Disponível em: https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/revolta/restauracao-da-bahia/. Publicado em: 05 de abril de 2022.