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Dossiê: História e Gênero
Organizadoras: Juliana Magalhães dos Santos (Doutoranda/UFF) e Talita Nunes Silva (Doutoranda UFF)

“Ninguém nasce mulher. Torna-se mulher”

A afirmação contundente de Simone de Beauvoir em “O segundo sexo” (1949) não apenas instigou as considerações sobre o gênero e seus estudos, mas também serviu como marco para a realidade não objetificável do corpo, a desvinculação da formação biológica e sua construção social. Nas primeiras décadas do século XX, as campanhas trabalhistas feministas abriram caminho para estudos inaugurais destacando a mulher como agente do processo histórico alertando o fato – observado por Virginia Wolf – de que o feminino “(…) Por pouco está ausente da história”. Essas preocupações foram captadas pelas inovadoras e influentes abordagens antropológicas sobre sexualidade feminina realizadas por Ruth Benedict e Margaret Mead, entre outros. Entretanto, o tema estava fadado a perder fôlego após a 2° Guerra Mundial, não fosse por Beauvoir. Suas indagações anunciavam e refletiam as necessidades femininas graças ao aumento da participação das mulheres em setores sociais ocidentais a partir do período entre guerras. Esse movimento se juntou ao coro de reivindicações que eclodiriam nas décadas de 1960 e 1970 com as manifestações pela ampliação de direitos sociais, liberação sexual e alternativas aos modelos políticos e econômicos vigentes. Porém, foram os estudos discutindo gênero e sexualidade de Michael Foucault e Kenneth Dover que reacenderam e renovaram, no campo das ciências humanas, a perspectiva antes intitulada História das Mulheres – de visão restritiva e relegada a apêndice de uma historicidade tradicional – para História de Gênero na década de 1980, longe dos biologismos e naturalizações, após revisão e ampliação interpretativa e documental. Joan Scott, uma das principais representantes da área, apresenta o gênero como definidor primário das relações de poder, expondo os antagonismos sexuais como gerador de tensões permanentes e indica a necessidade de enxergar a hierarquia entre os sexos como algo construído. Partilhando denominadores comuns como a busca pela multiplicidade de representações do feminino no campo sociopolítico, Michael Perrot, Rachel Sohiet, Natalie Davis, Arlette Farge, Sebilotte Cuchet, entre outras, dividem este vasto e complexo universo com teóricos como Judith Butler, responsável por proposições inovadoras sobre o gênero enquanto performance. Segundo esta definição, o gênero não é visto como inerente ao indivíduo, mas como uma imitação repetitiva de determinados comportamentos e atributos de modo a passar a impressão de que são reais. É por meio dessa performance, realizada por hábito ou por imposição, que os indivíduos são levados a acreditar que o gênero é natural. Tal perspectiva tem influenciado as pesquisas na área que se afastam dos questionamentos sobre as identidades para se ater nas práticas, ou seja, sobre em que medida o ser ‘homem’ ou ‘mulher’ interfere na atuação social.

Deste modo, podemos entrever que a diferença dos sexos não é sempre a estrutura organizadora das sociedades, isto é, o sexo é apenas um dos critérios de diferenciação existindo outras formas de categorização que às vezes são mais fundamentais para os indivíduos e as comunidades. Os estudos de gênero deveriam então buscar compreender o lugar assumido pela diferença dos sexos nas sociedades, ou seja, onde, quando e como esta diferença é significativa. Por acreditarmos na necessidade de ampliar o debate sobre o tema, a Revista Cantareira – periódico do corpo discente da Universidade Federal Fluminense – convida à chamada de artigos para a sua 24ª edição, cujo dossiê é intitulado “História e Gênero”. Com objetivo de oferecer uma oportunidade para os pesquisadores exporem suas investigações sobre gênero e sexualidade de maneira a incentivar a produção brasileira na área, mostrando que a análise desse campo de estudos permite exercitar a alteridade necessária para pensar e compreender nosso próprio contexto histórico.

A revista, além dos artigos conexos ao dossiê, também aceitará textos para a seção livre, resenhas e transcrições comentadas sobre variadas temáticas. Aos que tiverem interesse em colaborar com a edição, as normas de publicação estão elencadas em http://www.historia.uff.br/cantareira. O prazo para o envio de artigos se encerra no dia 30 de abril de 2016.